Chuvas de inverno preocupam produtores e podem afetar a safra de café

As chuvas fora de época, combinadas com a chegada de massas de ar frio, acenderam o alerta entre produtores de café do Sudeste do Brasil. O fenômeno climático, que acontece justamente durante o período de colheita do café arábica, pode prejudicar tanto o rendimento quanto a qualidade da safra de 2025.

Segundo a consultoria Nottus, o avanço de frentes frias sobre os estados de São Paulo e Minas Gerais deve ocorrer nas próximas semanas. As previsões indicam que a combinação de umidade e temperaturas mais baixas tem potencial para interferir diretamente nas lavouras. Mesmo em volumes moderados, a chuva nesta época do ano atrapalha o processo de colheita, além de aumentar o risco de doenças nos pés de café.

Frio e umidade no momento errado

A maior parte da colheita de café arábica no Brasil acontece entre maio e agosto. É justamente nesse intervalo que as lavouras precisam de tempo seco para permitir que os frutos sejam recolhidos com facilidade e qualidade. Quando a chuva chega fora do esperado, o solo pode ficar encharcado, dificultando o acesso das máquinas ou dos trabalhadores. Além disso, há o risco de que os grãos maduros caiam antes da hora, reduzindo o aproveitamento da colheita.

Outro problema é que o excesso de umidade favorece a proliferação de fungos e doenças, como a podridão e a ferrugem. Essas condições afetam a qualidade final do café, prejudicando características como aroma, sabor e acidez. Mesmo quando não há geadas — fenômeno temido pelos cafeicultores — o frio prolongado já é suficiente para atrasar o ciclo de desenvolvimento dos frutos.

Especialistas observam que o clima instável não afeta apenas a operação no campo, mas pode impactar também o mercado. De acordo com o Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), as condições climáticas dos últimos dias já têm provocado lentidão na colheita. Isso, por sua vez, pressiona os prazos de secagem e beneficiamento dos grãos.

Safra mais lenta e instabilidade no mercado

O clima atípico desta safra vem após anos marcados por extremos. Entre 2021 e 2023, o setor sofreu com secas prolongadas, geadas severas e variações bruscas de temperatura. Agora, com o enfraquecimento do fenômeno La Niña e a transição para uma condição de neutralidade no Oceano Pacífico, a expectativa era de maior estabilidade. No entanto, o avanço de frentes frias ainda no fim de junho mostra que a transição pode vir acompanhada de efeitos inesperados.

Na semana passada, o preço do café arábica na bolsa de Nova York chegou ao menor patamar em dois meses e meio, justamente após previsões de chuva moderada nas regiões produtoras do Brasil. Apesar da queda momentânea, o mercado segue atento. Os estoques globais permanecem baixos, e o desempenho da safra brasileira segue sendo um fator central na formação dos preços internacionais.

A incerteza climática traz desafios extras. Além de atrasar a colheita, o tempo úmido pode forçar produtores a colher grãos ainda verdes para evitar perdas. Isso compromete o resultado final e afeta a classificação do café, especialmente nos segmentos mais exigentes de cafés especiais.

Medidas de contenção e adaptação

Diante desse cenário, os produtores vêm adotando medidas para minimizar os prejuízos. Monitoramento constante da previsão do tempo, ajustes no cronograma de colheita e cuidados extras com o manejo são algumas das estratégias adotadas. Em muitas fazendas, há um esforço para antecipar o recolhimento nos talhões mais adiantados, aproveitando as janelas de tempo seco.

Além das ações imediatas, cresce entre especialistas e cafeicultores a discussão sobre medidas de longo prazo. Entre elas, estão o uso de variedades de café mais resistentes ao clima, sistemas de sombreamento com árvores nativas e práticas de conservação do solo. A adoção de técnicas de irrigação eficiente e o planejamento de plantio em áreas menos vulneráveis também ganham força como alternativas sustentáveis para o futuro.

O setor cafeeiro já entende que os eventos climáticos extremos estão se tornando mais frequentes e que a resiliência da lavoura depende de adaptação constante. Pesquisas agronômicas, parcerias com universidades e o uso de tecnologias para análise climática têm se mostrado aliados importantes na tentativa de reduzir perdas.

Um cenário que exige atenção contínua

Embora o risco de geadas fortes ainda não tenha se confirmado para esta safra, a possibilidade de novas ondas de frio e chuvas isoladas segue no radar dos meteorologistas. O período já está oficialmente com temperaturas abaixo da média em algumas áreas produtoras, o que reforça a necessidade de atenção.

Para o consumidor, o impacto pode não ser imediato. Mas se as condições persistirem, é possível que o café de maior qualidade tenha disponibilidade reduzida e preços ajustados nos próximos meses. O segmento de cafés especiais, que depende diretamente do controle de variáveis como ponto de maturação e secagem, é o mais vulnerável aos efeitos do clima.

O Brasil, maior produtor e exportador de café do mundo, tem uma cadeia produtiva robusta, mas que continua sensível a eventos meteorológicos fora do padrão. A colheita de 2025 ainda está em andamento, e os próximos 30 dias serão decisivos para definir o desfecho da safra. Enquanto isso, produtores, cooperativas, torrefadores e consumidores acompanham atentos o comportamento do tempo — um dos fatores mais imprevisíveis e decisivos para o café que chega à nossa xícara.

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